3 de ago. de 2013

Cativeiro

Uma carta na mesa.
Café derramado, manchando uma parte do papel. Ainda dava para ler. "Cansei de viver nesse cativeiro." Mancha de café. "Acho que devo ir embora, então seu silêncio terá paz". Mancha de café.
Sentou-se na cadeira mais próxima, a carta amassada entre os dedos. Subiu a mão na cabeça. Parou. Pensou.
Só havia um lugar onde ela poderia estar. Mas não. Desse a ela um tempo. Um tempo para pensar se a decisão era errada ou... Se era a mais correta de sua vida.
         Nevaria muito em breve, e as coisas não eram mais as mesmas. Antigamente, a neve era tão feliz. Tão pura e simbólica. Dois dias. Dois dias.
         Buscá-la ou deixa-la partir? A escolha mais importante que teria de fazer. Logo pela manhã, sem sentir o cheiro de café forte da cozinha. Ou pela tarde, sem regar o jardim. A estufa ficava fechada na neve. Mas nesse tempo sem cuidados, a neve cairia sobre todas as espécies. À noite, sem o chá especial, cuja receita ela jurara nunca dizer.  
         Segundo dia, ou último. Meia noite e meia, mas já o dia seguinte. A cama parecia vazia e ainda maior que antes, enquanto o quarto parecia tão silencioso quanto um jazigo. A janela parecia trancada a sete chaves. Esperou o dia nascer.
         O carro não ligou por causa do frio. Pegou um táxi.
         “Pode me deixar aqui mesmo, que agora vou andando”, e pagou o marcado no taxímetro. Dois quarteirões de escuridão branca, uma neve de um metro já tomara a cidade. No fim de uma rua estreita, uma porta de madeira gasta.
         Batidas no carvalho.
         Ela mesma abriu.
         “O que veio fazer aqui?”. Perguntou serenamente.
         “O café manchou a outra parte da carta”, disse, em tom sério. “Queria que dissesse, olhando em meus olhos, o que estava escrito”.
         Silêncio.
         Ela foi a seus braços, e abraços.
         De volta ao cativeiro.




Lady Viana

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