A expectativa era grande. Famílias e famílias reunidas em volta da loja principal da pequena cidade americana.
Um caminhão de pequeno porte parou do outro lado da rua. Um moleque de boina verde-alfaiate quis correr na direção, mas sua mãe o segurou pelo ombro. Dois brutamontes desceram e abriram atrás; um caixote enrolado num pesado pano branco foi trazido para a loja por eles. Parecia pesado, mas não tão grande. Foi esse o marco da primeira "modernização" das mídias de comunicação nas cidades dos Estados Unidos, a nação mais consumista do mundo inteiro.
Semanas depois, o jovem menino sentava no braço do sofá; a irmã, mais velha, do lado oposto. O pai, de terno grosso e sapatos italianos beijou sua esposa, que ficava de pé atrás do sofá verde. Ele tirou a gravata e colocou no quarto. Voltou para a sala e, junto com sua família, via um programa na tevê que se poderia chamar de "entretenimento".
Todo os dias, assim que anoitecesse, a mãe tirava o bolo do forno. A filha desligava o telefone e pedia que
sua amiga Jane, da casa ao lado, ligasse depois para falar sobre o Robert. O menino tirava os sapatos e deixava na sala, e sua mãe o obrigava lavar a sola e largar do lado de fora. O pai tirava a gravata e...
Família reunida. O conforto da década de 50-60.
Onde foi que erramos? Ah, sim. Décadas depois, Jane casou-se com Robert e seus filhos conheceram algo novo, diferente e revolucionário, a segunda "modernização" chamada... "Computador".
A mãe voltava do trabalho no fim da tarde, buscava os filhos na escola, e ao chegar em casa, seu marido já estava na cozinha com um sorriso de alívio por ver sua família em casa - mais uma vez.
Os pequeninos correriam e pulavam, insistiam ao pai que os deixasse brincar no novo aparelho. Com entusiasmo, os dois pais, sentados na cadeira atrás, assistiam seus filhos jogarem algo na tela. Depois disso, para um outro aparelho - dessa vez, um pouco menor - onde as duas crianças podiam brincar juntas, com um tal de "controle" na mão.
Mas ainda, onde foi que erramos? Ah, sim. Décadas depois, os filhos de Jane casaram-se e seus filhos, com doze anos, conheceram algo novo, a terceira "modernização" chamada... Bom, não sei se há um nome. Talvez muitos. Notebook, Netbook, Ipad, Tablet, Iphone, Ipod, Galaxy, Android, Google, MSN, facebook, twitter, GPS... Tenho certeza de que há mais.
Os filhos dos filhos de Jane sentam-se no natal em volta da antiga televisão - onde seus avós e bisavós entretiam-se - e se pensam "como podiam viver assim?". Os avós e bisavós dos filhos dos filhos de Jane sentam-se no natal em volta da antiga televisão - onde costumavam entreter-se no passado - e, ao observar os filhos dos filhos de Jane com algo plano, de cor metálica e que emite sons e luz nas mãos, perguntam-se, em voz alta, "como podem viver assim?" - mas os jovens não ouviram, estavam entretidos demais nos seus aparelhos.
Os velhos, como foram chamados alguns minutos depois, com os olhos nostálgicos, sentiram uma dor no peito; essa, só os antigos podiam sentir. Esses jovens jamais sentiriam o prazer de sentar-se com a família pela noite e assistir simplesmente um programa - e sorrir!, sorrir como tolos, somente pelo fato de estarem juntos. Onde estava Jane? Onde estavam seus filhos? Onde estavam seus netos? Estavam ramificados - mas não se preocupe, vovó! diziam eles. Eles vão te mandar um SMS ou te ligam numa videoconferência para dizer "feliz natal". Ano que vem, talvez - disseram os jovens - talvez ano que vem eles venham comemorar com você.
E um sorriso. Saíram pela porta. O vento que entrou foi o mais frio de todos.
Velhos. Estamos velhos.
Feliz Modernização.
Lady Viana.
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